Ramos como saúde, agro e crédito não apenas se mantiveram estáveis diante dos inúmeros desafios impostos pela emergência sanitária, mas também cresceram e se tornaram ainda mais competitivos
Patrícia Barcelos
No dia 5 de maio de 2023, a OMS declarou, oficialmente, o
fim da emergência de saúde pública para Covid-19 no mundo, o que muitos
batizaram de "fim da pandemia". Pouco mais de 3 anos após o início da
emergência global, e com um saldo mundial oficial de mais de 7 milhões de
óbitos, a pandemia não levou apenas vidas humanas, ela também representou um
período de dificuldades financeiras para milhares de empresas que, como milhões
de vidas, também sucumbiram.
Diante das incertezas que o cenário trouxe, dos inúmeros lockdown´s que precisaram ser impostos à
indústria e ao comércio de bens, serviços e turismo, empresas de todos os
portes e segmentos tiveram que se reinventar e se adaptar rapidamente às novas
dinâmicas do mercado – muitas conseguiram; outras, não. Investimento em
tecnologia, criação de estruturas para teletrabalho – o controverso home office – números alarmantes de
absenteísmo por causa do vírus e necessidade de demissões que exigiram muitos
recursos para despesas indenizatórias foram alguns exemplos dos desafios que o
setor produtivo precisou enfrentar desde o anúncio do início da pandemia, em
março de 2020. Se para as empresas de natureza mercantilista a capacidade de
investimentos inesperados e a velocidade para tomada de decisão foram
fundamentais para atravessar meses de turbulência econômica, para as
cooperativas os desafios não foram diferentes, mas o desenrolar das decisões, e
suas consequências, mostrou que esse segmento estava pronto para enfrentar, e
vencer, as batalhas que a emergência global impôs ao mercado em todo o mundo.
Luís Alberto Pereira, presidente do Sistema OCB/GO |
Para o presidente da OCB/GO, Luís Alberto Pereira, a pandemia foi um período de grandes desafios, mas também de surgimento de oportunidades. “Com a nova realidade, as cooperativas tiveram que se adaptar de maneira rápida e eficiente. As do ramo agro continuaram a atender a demanda de produção e distribuição de alimentos em um momento de escassez. As cooperativas de crédito já estavam tecnologicamente muito bem preparadas e não apenas intensificaram o atendimento virtual, com diversas soluções, como também solucionaram a demanda de crédito do agro e de outros negócios de seus cooperados, o que ajudou a manter a economia em movimento”, analisa o presidente da OCB/GO.
O
preparo das cooperativas de crédito para lançar mão da tecnologia em resposta
às demandas oriundas da pandemia permitiu, segundo o diretor-executivo da
Sicredi Celeiro Centro-Oeste, Eduardo Duarte Gonçalves, que a cooperativa
percebesse que a tecnologia é um aliado fundamental, mas é preciso cuidado para
que seus benefícios não gerem distanciamento entra a cooperativas e seus
associados. “Nossa cooperativa aprendeu muito sobre a importância de se manter
sempre próximo ao associado. E não estamos falando apenas de proximidade física
do dia a dia, mas aquela que é possível por meio da tecnologia, mesmo à
distância, pois ela é uma ferramenta fundamental para desenvolver e fortalecer relacionamentos
e isso nos levou a implantar o modelo ‘fisital’ (físico e digital), que
privilegia tanto o contato presencial, como o telefônico ou por WhatsApp,
potencializando cada canal para que o associado se sinta atendido em tudo o que
ele precisar, por parte da cooperativa”, afirma Eduardo ao lembrar que esse
modelo permite que o associado, que é dono do cooperativa, se sinta participante
do negócio e reforce, ainda mais, essa percepção que é orgânica no modelo
cooperativista. E o fortalecimento desse relacionamento entre cooperativa e
cooperado, na visão do diretor-executivo da Sicredi Celeiro, ficou evidente por
meio do crescimento da cooperativa. “O que a gente observa é que a cooperativa
cresceu muito na pandemia, essa relação de confiança entre associado e cooperativa
ficou evidente. Nossa instituição é forte, nosso associado acredita na
cooperativa, precisa dela e nós experimentamos um aumento expressivo nos nossos
volumes de recursos aplicados”, comemora.
Eduardo Duarte Gonçalves, diretor-executivo da Sicredi Celeiro Centro Oeste |
Atuando
em outro segmento altamente demandado na pandemia, as cooperativas de saúde,
segundo Luís Alberto, foram fundamentais durante os últimos 3 anos. “As coops
de saúde também foram essenciais no acolhimento à demanda de pacientes, no
repasse de informações seguras sobre questões sanitárias, além da adaptação do
atendimento para o remoto, tão necessário naquele momento, com teleconsultas,
por exemplo”, relembra. Segundo relato do superintendente da Central Unimed Cerrado,
Rogério Rocha, “o segmento de saúde foi, evidentemente, o mais afetado
pela pandemia da COVID-19, precisando encontrar respostas eficientes para as
demandas de maneira urgente. Na Unimed Cerrado também houve uma necessidade de
adaptação e intensificação das estratégias de gestão”. Pilares como gestão do
negócio e de pessoas, relacionamento com os clientes e saúde financeira foram
tratados em suas particularidades para minimizar os impactos impostos pela
emergência global.
Atuando no norte goiano, a Central Unimed Cerrado é composta
por cinco singulares: Unimed Goianésia, Unimed Porangatu, Unimed Itaberaí,
Unimed Norte Goiano, em Uruaçu e Unimed Vale do São Patrício, em Ceres. Em
todas as unidades, Rogério Rocha explica que os principais desafios foram “a
capacidade para se adaptar, de forma rápida, fazer o gerenciamento eficaz de
demandas constantes, maturidade para lidar com a incerteza – tanto do nicho da
saúde, como do mundo, diante de uma crise sanitária global, a administração dos
impactos financeiros e a manutenção de uma gestão que não descuidasse do
bem-estar dos colaboradores”, relembra ao afirmar que esses desafios são, na
verdade, permanentes, mas foram potencializados durante os últimos anos.
Cooperativas do agro
“A princípio foi um susto”, recorda Dourivan Cruvinel de Souza,
presidente-executivo da COMIGO, umas das cooperativas mais longevas e
lucrativas de Goiás, ao recordar o início da emergência sanitária e a
determinação para que tudo fosse fechado. “Vivemos aquele estresse do cooperado
não poder vir até a cooperativa, mas continuamos com a nossa produção industrial
processando todos os nossos produtos e realizávamos a vendas por telefone e
WhatsApp, nos dedicando para mantermos a normalidade dos processos, pois a
produção agrícola não podia parar”, relembra.
Fundada em Rio Verde (GO), há quase 50 anos, a COMIGO possui
quase 11 mil cooperados em seu quadro social e faturou mais de R$ 15,5 bilhões
em 2022. Tantos anos de mercado e uma gestão estável e sólida foram
fundamentais para promover as adaptações exigidas pela nova realidade imposta
pela pandemia. “Tivemos que nos adaptar às novas exigências que surgiram. Antes,
o relacionamento e as negociações eram só ‘olho no olho’, mas naquele momento
tivemos que ser mais ativos nas redes sociais, implantamos pagamentos por meio
de PIX, pedidos via WhatsApp, reuniões online e tudo isso, no fim das contas,
mostrou ser uma grande melhoria para os nossos processos de comunicação e de
venda e sabemos que isso veio para ficar”, declara Dourivan.
Dourivan Cruvinel de Souza, presidente-executivo da COMIGO |
Vencendo dificuldades
Entre
as dificuldades experimentadas, na visão do superintendente da Unimed Cerrado, pode-se
mencionar o fato de que “a gestão democrática exigiu um maior esforço de
comunicação e alinhamento entre os cooperados. Tomar decisões em um cenário de
incertezas e mudanças rápidas foi um desafio”. Por outro lado, Rogério explica
que “o formato cooperativista facilitou as comunicações de forma rápida e
unificada, assim como o intercambio possibilitou o apoio mútuo entre as
cooperativas”. Do ponto de vista dos cooperados, Rogério Rocha relata que “a pandemia
exigiu uma maior cooperação e solidariedade entre eles. Como a cooperativa é formada
por profissionais de saúde, muitos desses cooperados estavam na linha de frente
do enfrentamento da crise sanitária, lidando com uma carga de trabalho
aumentada e riscos elevados. A união e apoio da cooperativa foram fundamentais
para enfrentar esses desafios”.
Para o diretor-executivo da Sicredi Celeiro, não é possível
eleger um único desafio ou mesmo indicar aquele que foi mais difícil. “Foram
vários desafios, desde a necessidade de tranquilizar nossos colaboradores, dar apoio
psicológico e estimular o otimismo de que venceríamos a pandemia, além de nos
mantermos próximos e acessíveis aos nossos associados num momento de tantas
incertezas, garantindo a boa comunicação e divulgação de informações relevantes.
Outro desafio foi garantir o respeito aos protocolos de saúde, como forma de
proteger os nossos públicos”, recorda Eduardo.
Diante dos cenários impostos pela pandemia, o de ser
cooperativa trouxe implicações positivas e outras nem tanto. Sobre as vantagens
experimentadas, quem explica é Luís Alberto. “Mais da metade da minha primeira
gestão à frente do Sistema OCB/GO foi durante esse difícil momento que passamos
no Brasil e no mundo. Mas, por conta das características do nosso modelo de
negócio, centrada nas pessoas, em primeiro lugar, posso afirmar que o
cooperativismo cresce nas crises e mostra seu potencial, porque trabalha de
forma coletiva, pautado na cooperação, na sustentabilidade e, sobretudo,
na confiança”, analisa.
No ramo crédito, a Sicredi é um exemplo de que os últimos três
anos, sob a ótica financeira, não poderiam ter sido melhores. “Nesse período de
pandemia a Sicredi praticamente dobrou de tamanho. Não paramos em nenhum
momento, continuamos nos estruturando, contratando e crescemos
significativamente o quadro de colaboradores e de associados. Permanecemos em
franca expansão, principalmente em Goiás”, comemora Eduardo Gonçalves.
Agora que a pandemia já pode ser considerada passado, para o
presidente da OCB/GO, não há dúvidas de que, em Goiás, o cooperativismo saiu
fortalecido desse terrível capítulo da história recente. “Mesmo com um cenário
tão adverso, de fechamento de empresas, queda de faturamento e,
consequentemente, redução de empregos, os números do cooperativismo goiano
cresceram e avançamos na participação do PIB de Goiás. Em 2021, no auge da
pandemia, as cooperativas registraram R$ 21 bilhões em receitas, o que
representava cerca de 10% do PIB. Não fechamos postos de trabalho e ainda abrimos
mais vagas nas cooperativas. Tudo isso, junto com o relacionamento diferenciado
das cooperativas, que estão sempre próximas dos seus associados, fizeram com
que a confiança dos cooperados no modelo de negócio aumentasse”, comemora Luís
Alberto.
Futuro
cooperativista
Mesmo
com os legados da pandemia, as metas traçadas para o futuro são ousadas e as
expectativas não poderiam ser mais otimistas. Segundo o presidente do Sistema
OCB/GO, “a nova gestão do Sistema OCB/GO tomou posse no último mês de maio e
assumimos o compromisso, nesse segundo mandato, que vai até 2027, de ajudar o
cooperativismo brasileiro a alcançar R$ 1 trilhão em prosperidade até o fim
desse prazo. Lançamos o desafio para que as cooperativas goianas somem R$ 50
bilhões em faturamento anual até 2027 e elevem o número de cooperados dos
atuais 400 mil para 600 mil. São metas ousadas, pois cada cooperativa vai ter
que multiplicar por cerca de 2,5 o seu atual faturamento, mas tenho certeza de
que conseguiremos. Nos próximos quatro anos, queremos continuar fazendo o
que está dando certo e focar em projetos que se mostrarem importantes, pelo
potencial de desenvolver o cooperativismo econômica e socialmente”.
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